Roberta Nomura
Em São Paulo
Com um parceiro 13 anos mais jovem ao seu lado, Emanuel conquistou em agosto o décimo título do Circuito Mundial de vôlei de praia. Aos 38 anos, a idade não parece pesar nas costas. A vasta coleção de troféus é variada, inclui um ouro olímpico e ainda não é suficiente para o paranaense. Com fama de bom moço e obstinado, o multicampeão foi do fracasso à redenção durante a carreira com auxílio do divã, em um percurso que começou com três reprovações no vestibular de medicina.
A inspiração inicial veio com a geração de prata. A medalha conquistada por William, Bernard & Cia. nos Jogos Olímpicos de Los Angeles-1984 levou Emanuel para as quadras de vôlei. “Ele era muito franzino e magrinho, mas tinha força. O médico falou para colocar no esporte para diminuir essa força e energia. E ele sempre foi apaixonado por bola”, contou o pai do jogador, Seu Manoel, 72 anos.
O aposentado foi um dos maiores incentivadores do filho e mantém a rotina de acompanhar os jogos sempre que possível. Hábito adquirido na adolescência do campeão olímpico. “Ele tinha um Fiat Panomara branco e levava a galera para um lado e outro. Minha mãe e o pai dele foram os que mais assistiram a gente jogar”, relembrou o amigo de infância Rafael Pazello, 38 anos, médico ginecologista e professor da Universidade Federal do Paraná.
O jeito tranquilo em quadra sempre foi elogiado por vários parceiros de Emanuel e é apontado como chave para o sucesso tanto nas areias como em casa. "Ele é um cara fácil de lidar e conviver. É uma honra e satisfação ser o primeiro parceiro dele, mas mais ainda é poder ter a amizade do ser humano. Ele tem uma gentileza e uma postura incrível como atleta, ídolo, pai, filho e amigo", afirmou Clesio de Marins Prado, funcionário público na área de esporte e primeira dupla do campeão olímpico.
"Melhor parceiro impossível. Ele tem uma capacidade incrível de se relacionar com as pessoas. No convívio diário, ele é extremamente flexível. Na maioria dos atritos aqui em casa, é ele quem cede. O altruísmo faz parte dele e ele não tem o ego inflado. Ele consegue discernir bem o momento que a outra pessoa está passando, comigo a TPM [tensão pré-menstrual] ou um dia ruim. E sabe se colocar no lugar do outro", elogia a ex-jogadora Leila, casada com Emanuel desde novembro de 2008.
O jogador de vôlei de praia casou-se pela primeira vez aos 24 anos e teve Mateus, 14. Em 2002, o paranaense se divorciou. O namoro com Leila teve início em agosto de 2003 e o casal é pai de Lukas (foto), de 1 ano. "É o maior papel dele. É extremamente dócil, educador, amável, parceiro. Isso não é média não. Ele sente a ausência do Mateus, que não mora com a gente. Com o Lukas ele está revivendo tudo. Não é muito diferente do que foi o primeiro. É companheiro e deixa o filho explorar o mundo. Eu tenho aquela coisa de mãe, de proteger. Ele dá liberdade. Tem um tato especial com criança", disse Leila.
O famoso casal evita os holofotes e se preocupa com a exposição exagerada, principalmente com a chegada de Lukas. Demonstrações explícitas de amor também não fazem parte do repertório deles. "Ele tem a correria dele, mas nunca deixa de elogiar, fazer um carinho. Mas ele não é de expor sentimento com gestos mais carinhosos na frente das pessoas. A discrição é uma característica forte. É a alma dele", descreveu a esposa.
Medicina, aliás, era a área que Emanuel pretendia seguir. “No terceirão [último ano do Ensino Médio], a gente caiu todo o pessoal na mesma classe. E ele pediu para ficar em outra sala porque precisava estudar para o vestibular de medicina. Ele sempre foi da galera, mas mais comportado. Não era bagunceiro”, contou Pazello, amigo de Emanuel desde 1980. Entre o vôlei e os estudos, ainda sobrava tempo para aproveitar a temporada de verão em Guaratuba, litoral do Paraná.
E foi após o fim do período escolar que Emanuel conseguiu unir suas duas paixões: praia e vôlei. Em 1991, ele fazia parte da equipe do Curitibano – time que revelou Giba – e ajudou na campanha na Liga Nacional. Paralelamente a isso, ele formou sua primeira dupla oficial na praia com Clesio. “Por sermos magros, ficamos conhecidos por Espeto e Graveto”, contou o campeão olímpico. Os bons resultados aliados à decepção de ver o clube priorizar atletas de outros Estados levaram o paranaense a ter mais apreço pelas areias.
Com seus 1,90 m, Emanuel também se considerava baixo para a posição de meio-de-rede que exercia em quadra – os quatro centrais da atual seleção brasileira têm mais de 2 metros. Um convite do experiente Aloizio e três reprovações seguidas no vestibular para medicina na Universidade Federal do Paraná foram os pontos-chave para o filho de Seu Manoel iniciar a carreira no vôlei de praia com total apoio dos pais. “Eu queria que ele fosse médico, mas o futuro era ele que tinha de escolher. Foi tudo bem, tranquilo. Não tivemos divergência”, contou o pai do jogador.
Em 20 anos de carreira, Emanuel jogou ao lado de vários parceiros: Aloizio (um ano e meio), Zé Marco (três anos), Loiola (três anos), Tande (um ano), Ricardo (sete anos) e, agora, o jovem Alison (com quem está desde o fim de 2009). E durante todo o período só aumentou a galeria de troféus: um ouro e um bronze olímpicos, dez títulos do Circuito Mundial, sete do Nacional, além de recordes pessoais.
O vasto repertório de títulos foi muito comemorado, mas não é suficiente para acomodar o paranaense. “Ele não reclama de nada e faz tudo o que pedem para ele. É disciplinado, tem alimentação e postura de atleta, dorme bem e sempre está em busca do melhor. Ele treina a hora que a gente marca sem problemas”, elogia a técnica Letícia Pessoa.
Mas a carreira vitoriosa e sem lesões graves também passou por um baque. Emanuel foi do “inferno ao céu” em um período de quatro anos. “Chegamos [ele e Loiola] como favoritos na Olimpíada-2000 e o nono lugar foi frustrante. Eu pensei em parar e resolvi deixar os Estados Unidos [onde eu fiquei por três anos], vendi tudo e voltei para o Brasil. Passei um tempo chateado com a vida, em depressão. Aí, adotei um psicólogo, uma estatística e recomecei o trabalho”, contou Emanuel. Quatro anos depois, veio a recompensa ao lado de Ricardo: o ouro olímpico em Atenas-2004. “Eu saí de lá debaixo para ir ao topo”.
Maior nome da modalidade do país, ele ainda faz questão de lembrar e elogiar cada parceiro, mas ele costuma destacar dois em especial. Sempre fala da importância de Zé Marco e relembra com carinho o vitorioso time formado com Ricardo. Mas, mesmo assim, nunca deixa de enaltecer as qualidades de cada um que o ajudou a chegar ao topo. Agora, lapida o jovem Alison, de 25 anos. “O Emanuel é um dos melhores do mundo e tem dado bastante conselho para o Alison, que vai ser o melhor do Brasil e até do mundo em pouco tempo. Como dupla, eles já são os primeiros do país”, analisou Seu Manoel.
As pessoas que conhecem bem Emanuel o definem como uma pessoa tímida e tranquila. Por isso, quem deu o primeiro passo do relacionamento que já dura oito anos foi Leila. "Em um jantar de patrocinador, eu soube que ele estava separado e pensei: 'nossa'. Comecei a me aproximar. Eu achava ele interessante e comecei a gostar ainda mais. Eu brinco que o único homem que eu paquerei, eu casei".
Em uma etapa no exterior, os dois foram passear em um shopping acompanhado por outras pessoas. "Todo mundo se separou. Entrei no provador e vi só os cachinhos. Peguei bermudas e chamei para pedir opinião. Algumas coisas caíram, eu fiz um barulho e ele perguntou se eu queria ajuda e botou a cara para dentro. Eu puxei ele e beijei", contou Leila.
A ex-jogadora de vôlei revelou ainda que ele demorou a acreditar em suas investidas. "Ele me achava bonita e pensava que eu estava a fim de zoar". O namoro começou em agosto de 2003. Em novembro de 2008, o casal oficializou a união e, agora, comemora um ano do filho Lukas, o segundo herdeiro de Emanuel, que já tinha Mateus, 14 anos.
Emanuel ganhou fama de pão duro do amigo de infância Rafael Pazello. "Ele não gastava dinheiro, era mão de vaca total. Agora melhorou um pouco porque está rico [risos]. Mas ele sempre foi econômico. A gente saía para comer e ele não gastava. Deve ter dinheiro de 1990 guardado até hoje", brincou o médico que conhece o campeão olímpico há 21 anos.
Depois de tantos anos de amizade, Pazello também conheceu o outro lado do amigo. "Fui assistir as etapas da Itália e da França do Circuito Mundial de 1997. Na época, o parceiro era o Zé Marco, que era o mais parecido com ele e o que mais tinha a ver: pacato, tranquilo, boa gente. E eu não tinha dinheiro. Então, ficava no quarto com eles e dormia no saco de dormir. Eles ainda me botavam na cama para ir para a arena e depois eu aparecia. O Zé Marco pegava umas frutas para eu comer. Foi muito legal. Nessa viagem, o Emanuel tinha voo cedo e eu que tive que fazer o check-out. Ele me deixou cem dólares. Era mão de vaca, mas estava preocupado comigo", revelou o amigo.
Emanuel sofreu para viajar a duas etapas do Circuito-2011. Em julho, uma ameaça de bomba impediu que o atleta embarcasse rumo à Alemanha, com destino final na Polônia. "Um bêbado começou a fazer um tumulto e disse que tinha colocado uma bomba no avião. Todo mundo teve que descer e teríamos que esperar. Mas com o prestígio dele, conseguimos um voo a tempo de competir", contou a técnica Letícia Pessoa.
O imbróglio não impediu que Emanuel e Alison jogassem na Polônia - terminaram com o bronze. O terceiro lugar na Finlândia - que sacramentou o título do Circuito Mundial - também teve fortes emoções no embarque. "O voo era 0h05. Na hora do check-in, a mulher falou: 'era para vocês terem voado ontem'. Ainda bem que ele conseguiu mudar o nosso voo", disse Letícia.
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