Sem fogo pan-americano no estádio, Toronto-2015 tem abertura inovadora
Bruno Doro
Do UOL, em Toronto (CAN)
Os Jogos Pan-Americanos estão oficialmente abertos. A chama pan-americana já brilha na cidade de Toronto. Nenhuma pessoa que estava dentro do Rodgers Centre, porém, viu a cena mais marcante em eventos desse tipo: o acendimento, propriamente dito, da pira. Isso aconteceu em uma praça ao lado do estádio de beisebol que recebeu a cerimônia, a céu aberto, para que qualquer pessoa visse.
Dentro do estádio, porém, ninguém ligou. A cerimônia, capitaneada pelo Cirque du Soleil, a trupe canadense que revolucionou o conceito de circo no planeta, brincou com alguns conceitos escritos em pedra na cartilha de eventos desse tipo. Os canadenses mostraram que não tem problema usar vídeos gravados para entreter o público – mais ou menos como Guy Ritchie já tinha feito com o salto de paraquedas da Rainha Elizabeth em na abertura dos Jogos de Londres-2012.
Paraquedas, aliás, que também estava presente em Toronto. Em uma homenagem às Olimpíadas de três anos atrás, Donovan Bailey, campeão olímpico em 1996 e ex-recordista mundial, foi mostrado no telão completando o revezamento da tocha: ele saltou de base jump do topo da CN Tower, o ponto mais alto de Toronto, para o telhado do estádio de beisebol que recebeu a cerimônia nesta sexta-feira. Depois, desceu do teto para o palco montado no campo.
Foi ele mesmo que saltou? A organização dos Jogos não deve falar oficialmente sobre o assunto. O Toronto Star, principal jornal da cidade, flagrou, no fim de maio, dois base jumpers franceses fazendo o truque, com uniformes idênticos. Nas arquibancadas lotadas, porém, ninguém ligou. Vídeo e apresentações ao vivo se confundem nesses tempos de ritmo acelerado de troca de informações. Se tão importante quanto viver a experiência é postar o momento para que os amigos possam compartilhar, assistir em um telão ou ver a ação ao vivo ficam muito próximos.
Com isso, Toronto acaba aumentando ainda mais o conceito de inclusão de que tanto fala em seu plano estratégico para o Pan. Toda a cidade teve a chance de viver a abertura. Não só quem estava no ginásio. Nada mais apropriado para uma cidade que acolhe quem por aqui aparece. Mais de 50% de sua população nasceu em outros países.
Além disso, os próprios astros da festa era representantes dessa pluralidade. Donovan Bailey, que foi ovacionado quando apareceu, nasceu na Jamaica. Steve Nash, a quem coube a ação principal do dia, nasceu na África do Sul. Seus pais deixaram o país porque não queriam criar os filhos em meio ao Apartheid.
Não bastasse isso, o show propriamente dito também tinha esses elementos. A trupe circense tinha 625 artistas no palco, vindos de 25 países diferentes. Em ação, quase 30 ex-atletas olímpicos e pan-americanos. E o espetáculo foi tecnicamente perfeito. Se primeira fase, em que foi narrada a criação do Canadá pelos povos indígenas, não chegou a empolgar, depois que os atletas desfilaram as coisas começaram a engatar.
Truques pirotécnicos, acrobacias, voos e tudo mais que o Cirque du Soleil sabe fazer com maestria. Ninguém sentiu falta, por exemplo, da apresentação de cantores locais. Vídeos, tratados como arte, faziam parte do espetáculo, não eram só um adereço.
Certamente uma inovação em cerimônias de abertura que costumam ser longas, chatas e confusas - prova disso foi que o público começou a sair do estádio quando Julio Maglione, o presidente da Odepa (Organização Desportiva Pan-Americana, órgão responsável pelo Pan), faz o seu discurso. Os atletas aproveitaram. Após um desfile animado, marcado pelas coreografias dos voluntários que marcavam o caminho e que, pouco a pouco, foram acompanhados pelos atletas, todos acabaram no meio da ação. Em um momento, até mesmo uma pista de BMX foi montada, no meio do campo, ao redor das delegações.
Os brasileiros estavam entre os mais animados. Foram muito aplaudidos ao entrar e conquistaram o público canadense. Thiago Pereira, nadador que busca se tornar o maior atleta pan-americano da história no Canadá, estava felicíssimo. Sorriu a todo momento, agitou a bandeira como manda o protocolo, sem ligar muito para o uniforme exótico da delegação: um terno verde, com detalhes em amarelo, como se estivessem vestindo a bandeira do Brasil.