Desenganada pelos médicos, Susana driblou a morte com ajuda da natação
Felipe Pereira
Do UOL, Em Toronto (CAN)
A parte menos desafiadora da vida de Susana Schnarndorf Ribeiro, 47 anos, foi ser pentacampeã brasileira de triatlo e completar 13 Ironman. Esta fase durou até a atleta completar 37 anos. A coisa complicou em 2005, quando foi diagnosticada com MSA (Atrofia Múltipla de Sistemas) e os médicos dizerem que ela tinha dois anos de vida. Neste tempo veria o corpo definhar até ficar imóvel numa cama esperando o dia que os pulmões não funcionariam mais.
"Todo mundo sabe que vai morrer um dia, mas quando ganha um diagnóstico de pouco tempo... Passei por todas as fases. Ficar muito triste, com depressão, pena de si mesma, com raiva."
Mas Susana conseguiu driblar a morte. Neste período ainda bateu vários recordes brasileiros de natação, foi campeã mundial em 2013 e agora esta em Toronto disputando o Parapan. Mas a virada na vida não aconteceu facilmente. A atleta lembra que tinham recém-ganhado a filha caçula quando veio o diagnóstico.
Apavorada, passava a noites na beira do berço imaginando que não veria Maila crescer. "Minha filha era bebezinho quando recebi diagnóstico. Minha doença nasceu quase junto com ela, eu sempre quis viver para ela me conhecer, saber quem eu era, saber que eu amava ela muito. Acho que estou tendo esta chance."
A depressão durou algum tempo, mas Susana percebeu que ficar em casa sentido dó de si mesma só ia acelerar a morte. Voltou a fazer algo que adorava, nadar. "Não queria que meus filhos me vissem desistindo."
As piscinas foram a porta de entrada para o esporte quando tinha 12 anos e partir dali conheceu o Brasil competindo e defendendo diferentes clubes. Mais uma vez a modalidade amparou Susana. Ela recobrou o ânimo e parou de tomar café como uma louca porque tinha medo de dormir e não acordar. Passar quatro dias em claro nunca mais.
Mas nadar deixou de ser uma tarefa fácil. A doença comprometeu o controle motor e afetou principalmente o lado esquerdo d corpo da atleta. Coração e principalmente o pulmão foram afetados e a capacidade respiratória dela hoje é de 47%. Susana aprendeu a fazer planos que duram somente 24 horas. Assim construiu sua carreira e é uma das melhores do mundo.
Mas os sonhos estão na essência do ser humano e ela tem um em especial. "Meu sonho maior que é ganhar uma medalha na Paralímpiada do Rio com meus filhos na arquibancada. Não tem nada igual a isso."
Ela morou os últimos 20 anos na cidade e todo dia passava na frente do parque aquático. Em nome da medalha, mudou para São Caetano do Sul, mas volta a cada final de semana para visitar os filhos e faz questão de repetir o ritual.
Dias difíceis
Mas não significa que tudo são flores na vida de Susana. Ela perdeu o paladar e está esquecendo o gosto dos alimentos. A doença não atrapalha apenas em acertar o ponto de cozimento ou quantidade de sal, a comida demora a descer pelo esôfago e é preciso um líquido para ajudar a descer.
Mas isto não é nada comparado à decisão que Susana tomou em 2008. Certa de que os três filhos não precisavam ver a mãe caindo no chão por falta de equilíbrio e se recusando a ser um peso para os familiares, decidiu que era hora do trio morar com o ex-marido.
Ela conta que o coração ficou dilacerado ao ver Kaillani, 17 anos, Kaido, 13 anos, e Maila, 10 anos, partindo. "Foi a decisão mais difícil da minha vida. Mas deu certo, eles tão felizes e tento ser a mãe mais presente que posso na vida dele."
Era o capítulo mais triste de uma história que começou quando Susana viam televisão e engasgou do nada. Estes episódios ficaram frequentes e após os exames veio o diagnóstico. A natação se tornou uma ajuda a manter o corpo na ativa e ela acredita que contribui para frear a doença. Mas são necessários remédios que não custam pouco e são bancados pelos resultados das piscinas.
"Meu tratamento não é um tratamento barato. Graças a Deus tenho bastante apoio, meus patrocínios. Meus remédios custam uns dois, três mil reais por mês."
Não é fácil, mas Susana lida bem com isto. Entende que há problemas maiores e até sente que antes se queixava muito por situações que nem são graves.
"Quando eu lembro de mim antes da doença acho que eu reclamava demais, me incomodava por pouca coisa. Tá calor, não vou sair. A moça que faz faxina não veio. Putz que drama. Agora tô nem aí, essas coisas não me incomodam mais."
Com o sonho de entrar no Maracanã ano que vem para cerimônia de abertura das Paralímpiadas, Susana segue sua filosofia de um dia de cada. Mas vontade de viver e o que não falta e competir em Tóquio 2020 já está no radar dela.
"Vou até no meu limite, quando não puder mais. Acho que depende muito da tua força de vontade e disposição para treinar. Eu adoro treinar, me faz muito bem. Eu me sinto como se tivesse 18 anos, com essas meninas que eu compito."