Por que time que mais perdeu do que ganhou tem "o feito do Pan" pro Brasil
José Ricardo Leite
Do UOL, em Toronto (CAN)
-
William Lucas
Brasileiros comemoram vitória histórica sobre os EUA no hóquei da grama no Pan de Toronto
Thiago Pereira virou recordista absoluto em medalhas. Marcel Sturmer ganhou mais um ouro e foi o primeiro brasileiro tetracampeão de uma mesma modalidade. Isaquias Queiroz, da canoagem, subiu duas vezes ao lugar mais alto do pódio. Foram mais de cem vezes que o Brasil viu representantes ganhar medalha nos Jogos Pan-Americanos de Toronto. Mas foi um time que tem mais derrotas do que vitórias e pode até voltar sem medalha que conquistou a maior glória na competição: o hóquei na grama.
O empate sem gols na quinta contra o forte Canadá, terceiro na última Liga Mundial, e perda da vaga para final só nos pênaltis quase rendeu o "impossível" de uma chance de medalha de ouro. Algo que ninguém acreditava no começo do Pan. E ainda tem a disputa do bronze, sábado, contra o Chile. Depois de quase eliminarem os donos da casa, o time era só emoção.
"É uma marca histórica. E a medalha de prata ficou a há dois passos. Acertaram mais chutes livres que nós. Saímos orgulhosos. Esse grupo resgatou o orgulho brasileiro de raça. Fizemos história e daqui 20 ou 30 anos vão lembrar que esse time chegou na final do Pan e empatou com o Canadá", falou o jogador Paulo Batista. "Quando chegamos aqui, muitos não acreditavam que nem chegaríamos no sexto lugar. Estamos há quatro meses suando só pensando nisso. Abrimos mão de muita coisa. Nossos familiares, amigos e brasileiros têm de se orgulhar de nós."
A seleção desse esporte existe há apenas 17 anos, tem um site que está fora do ar e chegou a Toronto sem nunca ter conquistado sequer uma vitória no torneio. Vivenciou massacres em sua única competição, em 2007, quando só participou pelo fato de ser país sede. Lá, terminou em último, com cinco goleadas e um saldo de 57 gols contra e um a favor. Levou 19 a 0 da Argentina. Nem se classificou para Guadalajara-2011.
Eis que, em tese, para 2016, a vaga seria certa na primeira Olimpíada por ser país-sede. Só que não. A Federação Internacional do esporte estipulou um desempenho limite para que a equipe pudesse estar presente: ficar entre os seis primeiros no Pan. O fato fez com que a competição valesse todo o ciclo, principalmente por carregar a pressão por evitar o vexame de ser o único esporte em que o país sede não teria nenhum representante (o time feminino já foi descartado, pelos mesmos critérios). A seleção feminina de hóquei, por exemplo, não teve a mesma sorte e está fora.
"Mostramos que estamos na Olimpíada por merecimento, não por favor. Chegamos e conseguimos a meta. Passamos perto da final. E espero que o maior feito do Brasil seja sábado no terceiro e quarto. Essa equipe nunca tinha vencido o México, os EUA, empatado com o Canadá. Está conseguindo vários feitos", falou o técnico Cláudio Rocha.
O duelo nas quartas era contra os Estados Unidos, um dos melhores da América, e que em 2007 havia vencido por 13 a 0. Mas o time brasileiro segurou o empate sem gols e venceu nos pênaltis, chegando na semifinal e conseguindo a vaga. Curiosa é a campanha brasileira até agora: foi apenas uma vitória nos cinco jogos (contra o México). Empatou duas vezes sem gols e perdeu de Chile e Canadá na primeira fase, apenas dois gols em cinco jogos. Mas é um time que joga com muita raça.
Na semifinal, o time deu um show de disposição em campo e voluntariedade para não deixar o rival jogar. Em certo momento, os nove jogadores de linha estavam dentro da área. Até desarme de carrinho (se jogando no chão e tentando interceptar com o taco) teve, de Lucas Paixão. É o estilo tático e raçudo do hóquei brasileiro.
"Para cada jogo temos uma estratégia diferente. Contra times fortes temos que jogar bem. O importante é não tomar gol aqui e fazer lá. Tem que brigar pela bola a cada segundo", disse o treinador, que foi jogador quando a equipe brasileira começou a engatinhar, há 17 anos.