Judoca que vai representar Brasil no Pan virou canhoto após lesão no braço

Guilherme Costa

Do UOL, no Rio de Janeiro

  • Reprodução / Instagram

    05.jul.2015 - Judoca Victor Penalber vai representar o Brasil nos Jogos Pan-Americanos de 2015

    05.jul.2015 - Judoca Victor Penalber vai representar o Brasil nos Jogos Pan-Americanos de 2015

Para alguém que lida com uma realidade tão efêmera quanto a trajetória de um atleta profissional, quatro anos são um período extremamente longo. Victor Penalber, 25, aprendeu isso da pior maneira possível: entre lesões e uma punição por doping, o judoca que vai representar o Brasil nos Jogos Pan-Americanos de 2015 passou um quadriênio longe dos tatames. No caso de alguém tão jovem, é impossível pensar no quanto os períodos de estiagem podaram a carreira. No caso dele, porém, o afastamento das competições também foi um agente formador. Penalber foi moldado pelas fases em que esteve longe do judô. Até canhoto ele virou por causa disso.

"Sempre fui destro, a minha base sempre foi para a direita, mas eu sempre procurei explorar o outro lado também. Isso acabou me ajudando. Com 15 anos eu tive uma lesão bastante séria no cotovelo, e isso me impediu de lutar para o lado direito. No judô é muito difícil trocar de lado, mas como fazia um tempo que eu não conseguia treinar eu pensei em treinar como canhoto. Pelo menos eu estaria no tatame. Só que aí começou a dar certo – eu já conseguia fazer uns golpes para o outro lado, mas a base foi ficando mais forte. No judô a gente normalmente acha o canhoto um cara um pouco mais chato. A quantidade de canhotos é menor e o costume de lutar com canhotos é menor. Eu vi aquilo como uma oportunidade, também, e acabei ficando. Dois anos depois eu estava entrando na seleção brasileira principal", relatou Penalber em entrevista exclusiva ao UOL Esporte.

Penalber começou a lutar judô quando tinha quatro anos de idade e foi campeão brasileiro aos nove. No entanto, só passou a ser verdadeiramente conhecido em âmbito nacional depois de ter virado canhoto – e de ter passado um ano longe dos tatames por causa da lesão. Foi a primeira grande estiagem na vida esportiva dele.

O segundo afastamento dos tatames aconteceu em 2008, quando Penalber tinha 17 anos. O judoca foi flagrado em exame antidoping, recebeu punição e ficou longe das competições por duas temporadas: "Eu era bastante novo e acabei sendo imprudente. É complicado para o atleta a ideia de ser responsável por todas as substâncias que entram no seu corpo, independentemente de onde vieram ou como vieram. A questão de tomar um suplemento por indicação de alguém é uma responsabilidade muito grande para um atleta novo, que não sabe o que acontece. Foi um golpe muito duro que eu tomei na vida".

Mais uma vez, porém, a ausência foi construtiva. "Me fez amadurecer, me fez ficar mais profissional e me fez ficar mais atento", opinou Penalber. "Quando eu não podia fazer tatame e nem físico, o treinamento era na cabeça. Meus colegas sempre me ajudaram muito, e eu queria retribuir. Os objetivos deles viraram os meus objetivos: eu ajudava nos treinamentos, mesmo sem poder treinar. Estudava junto, e isso acabava sendo um treinamento para mim também", completou.

Quando voltou, Penalber chegou a liderar o ranking mundial na categoria até 81kg. Em 2013, porém, o brasileiro perdeu para Loic Pietri na terceira luta do Mundial de judô – o francês acabou conquistando o título.

Aí veio a terceira interrupção brusca na carreira de Penalber. O judoca precisou ser submetido a uma intervenção cirúrgica para corrigir um calo ósseo formado por causa da cicatrização ruim do primeiro problema. Foram mais oito meses longe dos tatames, e a operação teve de ser refeita porque um parafuso estava saindo. "Aí foi um tempo menor. Eu consegui lutar no Japão dois meses e pouco depois da segunda cirurgia", disse o atleta que treina atualmente no Instituto Reação, em Jacarepaguá-RJ.

A segunda operação de Penalber foi feita em outubro de 2014. Com as intervenções, o judoca conseguiu corrigir um problema no braço direito, algo que gerava uma deficiência biomecânica nas lutas desde a fratura sofrida aos 15 anos. Isso possibilitou uma mudança nos treinos: ele passou a trabalhar também como destro.

"Estou a cada dia melhor, mas o trabalho demora. Tenho de ganhar força, jeito de usar o braço. Eu muitas vezes defendia muito, e não é um trabalho apenas de força, mas de cabeça. Espero que isso seja uma das grandes armas para 2016", projetou Penalber. "É uma das coisas que a gente tem trabalhado: entrar pelo outro lado sem mudar a pegada. Acaba sendo um ataque surpresa. Isso pode ser uma arma muito poderosa no judô: existe uma base definida, e o desequilíbrio para você entrar por um lado tem uma técnica", adicionou.

Os últimos períodos de afastamento mostraram a Penalber a necessidade de mais um trabalho. Desde o início de 2015 o judoca tem feito acompanhamento psicológico a fim de minimizar erros nos Jogos Pan-Americanos e no Mundial deste ano, que podem pavimentar o caminho dele até a Olimpíada Rio-2016.

"É uma oportunidade única. Não sei se vai ter outra Olimpíada no Brasil. Eu penso nisso como algo melhor do que os meus melhores sonhos. Quando pensei em ser um atleta e estar na seleção eu nunca cogitei a possibilidade de lutar uma Olimpíada dentro do Rio de Janeiro. As competições de judô ficam a menos de um quilômetro de onde eu moro", explicou Penalber.

A categoria de Penalber é a mesma de Leandro Guilheiro, que tem duas medalhas de bronze em Jogos Olímpicos (bronzes em Atenas-2004 e Pequim-2008), mas que esteve afastado dos tatames por dois anos e só voltou a lutar em outubro. A existência de uma sombra como ele ratifica a importância da atual temporada para o líder do ranking nacional.

"Preciso provar tudo que eu venho conquistando nos últimos anos, e o fato de ter um atleta como o Leandro Guilheiro, medalhista olímpico e medalhista mundial, só me motiva ainda mais. Eu sei do risco, porque ele sempre vai ser um cara com condição de medalhar. Essa disputa só é boa para o Brasil porque eu o faço evoluir e ele me faz evoluir", concluiu Penalber, que ainda é visto como um judoca canhoto: "Quem me conhece sabe que eu sou destro, mas as pessoas na seleção não sabem. No judô eu sou canhoto desde que as pessoas me conhecem".

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