UOL Esporte - Pan 2007
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08/07/2007 - 09h30

Teste arbitrário "mutila" equipe brasileira de esgrima no Pan

Bruno Doro
Enviado especial do UOL
No Rio de Janeiro

A equipe brasileira de esgrima não estará completa no Pan-Americano do Rio de Janeiro por causa de um teste que pouco tem a ver com a modalidade: corrida. Após a lesão de Lívia Lanzoni, nenhuma brasileira foi convocada para ocupar a segunda vaga do sabre.

Sílvia Rothfeld vai competir no Pan com uma roupa nova de esgrima graças a uma aposta com Deise Falci. Por causa do teste de corrida, Deise disse que iria dar uma roupa à amiga caso as duas fossem juntas ao Pan.

"Por isso, estou de roupa nova", orgulha-se Sílvia. Foi ela quem indicou seu próprio treinador para a colega, que, no dia da prova, contou com um auxílio inusitado: cola.

"Eu tinha todos os tempos e as distâncias anotadas no braço, para cumprir as minhas metas. Meus dois braços estavam inteiros cobertos de tinta vermelha. E ainda tive problemas com meus relógios: os dois que eu tinha sumiram. No dia do teste, tive que emprestar um", lembra a atleta, que é dona de uma loja de artigos para esgrima.
APOSTA PELO PAN
"Estou sozinha porque ninguém mais completou o teste da Confederação. Só eu e a Lívia, que era a quinta do ranking, passamor. A segunda nem fez o teste e a terceira e a quarta não correram (dentro do tempo limite)", explica Deise Falci, baiana com forte sotaque gaúcho.

O teste a que a atleta se refere é uma corrida de 12 minutos, em que os homens devem completar 3000 metros e as mulheres, 2600. "Eu não vou dizer que a corrida não fez bem. Fez bem, sou uma atleta melhor. Mas não é porque eu corro mais rápido que sou melhor esgrimista. Tem gente que ganha tudo que pode ficar fora do Pan porque não corre", reclama Sílvia Rothfeld, do florete.

O caso a que ela se refere também está causando um desfalque no time. Roberto Lazzarini entrou com um processo contestando a decisão da Confederação Brasileira de Esgrima em excluí-lo do Pan, após não cumprir a meta no teste. Ele teve sua primeira liminar derrubada, mas tem até terça-feira para conseguir outra.

O caso apenas se decide na quarta-feira. Se Lazzarini conseguir uma nova liminar, deve ser confirmado no time e finalmente chegar à Vila do Pan, onde a esgrima está desde sábado. Se ele não conseguir, quem fica com a vaga na espada é o catarinense Fernando Linschoten.

Uma das armas de Lazzarini é um laudo de Nabil Ghorayeb, o mesmo médico designado pelo COB (Comitê Olímpico Brasileiro) para avaliar os atletas convocados para os Jogos Pan-Americanos. Nele Ghorayeb afirma que "esse teste foi criado em 1968 e não tem, na atualidade, qualquer embasamento científico que justifique sua aplicação para avaliação de atletas".

Toda essa disputa permeia um protesto silencioso contra o presidente da Confederação Brasileira de Esgrima, Arthur Cramer. As atletas evitam críticas diretas ao dirigente, mas não deixam de alfinetar.

"Desde 2003, ele estipulou um teste de corrida. E ponto. Se tu não passas, está fora. Antes do teste, eu disse para o meu técnico de esgrima que me sentia como uma garota de 15 anos, de tão nervosa", conta Sílvia.

"O que ninguém concorda é que pra ti fazer o teste não é impossível, mas tu tens que ter tempo para treinar a corrida. E a esgrima é um esporte amador, a gente não vive só disso. Eu praticamente parei de trabalhar para passar. Você está classificada no teu esporte e de repente é eliminada por causa de um que não tem nada a ver", completa Deise.

A figura de Cramer é tão mitológica na cabeça das esgrimistas que uma delas até mesmo sonhou com o dirigente. "Alguns dias antes do teste eu estava só pensando nisso. Eu sonhei que estava correndo e depois de duas voltas uma meninas entraram na pista e me agarraram, como aconteceu com o Vanderlei (Cordeiro, na maratona das Olimpíadas de Atenas). Como eu tinha feito só duas voltas, olhei para o Cramer para poder começar de novo e ele disse que eu estava fora do Pan", lembra Deise.

A esgrima no Pan será disputada de 14 a 21 de julho, no Riocentro.