UOL Esporte - Pan 2007
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10/04/2007 - 08h50

Pelo Pan, quarentonas abrem mão de carreira, casa e filhos

Fernanda Brambilla
Em São Paulo

O Pan sempre serviu de batismo de fogo para jovens atletas diante dos holofotes, mas também reserva espaço para sua ala veterana. Nos Jogos do Rio não será diferente. Combatendo o preconceito e conciliando cabelos brancos, treinos, casa, carreira profissional e filhos, as "quarentonas" Janice Teixeira, Karen Redfern, Jacqueline Costa e Roseli Santos sonham com medalhas pan-americanas.

O PAN VETERANO
Ampla Comunicação
"Meu marido assumiu a casa, até me dói na consciência", Jacque Costa, 43
UOL Esporte
"Meu filho dá pitaco no treino: 'Mãe, não faz isso'", Roseli Santos, 43
Folha Imagem
"Minha mãe fala pra eu largar o squash há 10 anos", Karen Redfern, 43
Divulgação
"Se esquecer os brincos acho que eu perco a prova", Janice Teixeira, 45
A ansiedade da contagem regressiva é contida pela desanimadora lista de afazeres domésticos: compras, faxina, arrumação da casa. O estresse dos treinos é intercalado por um rápido monitoramento do desempenho escolar dos filhos, que são os primeiros a cobrar resultados da mãe. Em meio aos jovens atletas, elas também prometem pôr ordem na casa.

Na seleção feminina de squash, a veterana Karen, de 43 anos, já avisa que no Pan, não quer "nada de bagunça" no alojamento. "As meninas já sabem que sou chata com horário e disciplina, pego no pé mesmo. Já assumi o papel de mãezona no Pan", conta Karen, que foi apelidada de "mami" pelas colegas Thaísa Serafini, 21 anos, e Mariana Pontault, de 26.

Com dois bronzes em Pan, a dona de 15 títulos brasileiros é alvo constante de olhares incrédulos do outro lado da quadra antes dos torneios. "As pessoas olham estranho quando vêem a velhinha aqui entrando em quadra. Mas eu estou bem, e é isso o que importa. Tem muita gente que fala pra eu parar, minha mãe mesmo fala isso há 10 anos", diz a atleta, que não pensa em largar a raquete. "Convivo tanto com essa molecada que acabo me sentindo jovem. Nem uso nada de creme para a idade", ironiza Karen.

No Rio, o boliche terá a equipe de idade mais 'avançada', por conta da dupla feminina, formada por Jaque Costa, 42, e Roseli Santos, 43. As 'bolicheiras' enfrentam dentro de casa os maiores desafios, que se estendem do acúmulo de tarefas domésticas à cobrança dos filhos.

No caso de Roseli, que fará seu primeiro Pan, a torcida não é nada boazinha. "Meus filhos também jogam, então muitas vezes assistem meus treinos. Aí é um tal de: 'Mãe faz isso, mãe joga assim, mãe não faz assim'. Mas eu não ligo, sei que estão tentando ajudar. A maior cobrança é deles", conta a atleta, que três meses antes do evento só 'respira boliche'. "Deixo meus filhos na escola cedo e vou pra academia. Só vou revê-los à noite, sem contar os dias em que viajo para competir. Ainda bem que no Pan eles estarão de férias, então podem ir torcer por mim."

Com tanta correria, resta pouco tempo para a vaidade. "O máximo que faço é pintar o cabelo, porque não é legal aparecerem os meus fios brancos", diz Roseli. "Ainda bem que no boliche o ideal é manter a descrição. Então, não uso jóias e nem pinto as unhas, porque senão todo mundo repara."

FOFÃO, A 'BALZAQUIANA'
Divulgação/CBV
Em um time que sempre se renova, a levantadora Fofão se destaca pela longevidade na seleção feminina de vôlei. Aos 37 anos, ela é a única remanescente do grupo do Mundial-94, em que o Brasil foi vice.

"Percebo que estou velha quando lembro algo que a Ana Moser ou a Márcia Fu fizeram, e elas dizem que nunca as viram jogando. Aí penso 'Nossa, faz tempo mesmo'", conta.

Com apelido vindo de personagem infantil da década de 80, Fofão assumiu agora de vez o papel de líder do elenco. "Elas vêm me pedir conselhos, porque sentem confiança em mim", diz, surpresa, e admite que a idade causou mudanças em sua rotina. "Agora eu me policio com comida, porque tenho que estar sempre sarada como elas", brinca.
Caso parecido é o de Jacque Costa, sexta colocada nas duplas em Santo Domingo-03, que se sente culpada por 'abandonar' o filho de 13 anos, para se concentrar só no Pan. "O Walter (Costa, seu marido, também jogador) assumiu a casa, até me dói a consciência", admite. "Ele também acompanha o Bruno na escola, cobra as tarefas, porque chego sempre tarde."

Na contramão das mães-atletas está Janice Teixeira, grande nome do tiro esportivo feminino no país. Prestes a completar 45 anos, a atleta, que também é publicitária, cursa Serviço Social e gerencia uma ONG, refuta a idéia de aposentadoria.

"Estou longe de ficar quietinha na cozinha. Foi justamente por isso que optei por não ter filhos, para não criar mais um idiota. Não me venha com essa de que babá cria filho pra gente", alfineta. "Vou na faculdade só quando dá, espero não repetir de ano. Meu sonho é ir para a Olimpíada. O resto, eu ajeito", afirma a atiradora, que levou bronze em Santo Domingo-03.

Para isso, Janice também conta com um marido 'do lar'. "Estou a passeio na minha casa. É ele quem cozinha, faz supermercado, faxina. E ele que não me ponha nada fora do lugar. Mesmo assim, ainda é difícil, porque não é a mesma coisa. Tenho que arrumar guarda-roupa nos fins de semana."

Destaque em um esporte praticado majoritariamente por homens, Janice faz questão de estar sempre produzida. "Não sou perua, mas alio um tipo esportivo com anel de brilhante", conta. "Por mim, quanto mais jóia eu puder usar, melhor. Se eu for competir e esquecer meus brincos, acho que perco a prova."